Arte Anestésica e Poéticas Pessoais: O Reflexo de uma Sociedade Obcecada por Aparências

A agonia da arte no mundo moderno. Em um cenário onde a arte, outrora um manifesto de transformação crítica, se dissolve em superficialidade, os artistas carregam o peso de uma criação ou sem propósito ou em um nível tão elevado que qualquer possibilidade de crítica (quando presente) ser entendida. O que deveria despertar consciências agora adoece mentes e corpos, aprisionando a expressão em inconscientes vazios. Este é um convite para refletir sobre como a essência da arte foi perdida — e o que ainda pode ser feito para resgatá-la.

12/21/20245 min read

A arte, outrora uma força indomável, agora rasteja como um animal ferido. Suas formas, que antes rompiam as barreiras do pensamento, agora se dobram docilmente às vontades de um público faminto por distrações vazias. O que deveria ser um grito de revolta tornou-se um sussurro abafado, um gozo errado, uma sombra de si mesma, deformada pelo peso de expectativas comerciais e pela indiferença de uma sociedade que consome sem digerir.

Os grandes momentos da história em que a arte moldou o mundo parecem hoje lendas distantes, histórias contadas por sobreviventes de uma era em que o espírito humano ainda ousava desafiar o inevitável.

A arte, penso que se tornou um cadáver bem maquiado. E eu, um coveiro que cavava buracos para enterrar qualquer resquício de significado.Fecho os olhos e tento lembrar o que me trouxe aqui. Mas a memória é um borrão, assim como a consciência crítica de cada um de nós.

No canto do quarto,espalhado ao longo da parede úmida, estava um pouco de caos em andamento. Encarei com uma mistura de repulsa e fascínio. Durante semanas, havia trabalhado em projetos, tentando capturar algo que escapava a cada tentativa. Um reflexo grotesco da própria incapacidade. Já não sei quando sou eu quem crio e quando sou criado.

A questão da superficialidade da arte contemporânea e seu impacto na saúde mental e no papel crítico da produção dos artistas se lançada luz através de uma perspectiva kafkiana, nos faz mergulhar em um universo onde a arte se torna uma entidade opressora, desprovida de qualquer propósito de emancipação. Era uma manhã como qualquer outra quando um pintor esquecido pelas galerias, despertou com uma sensação de peso insuportável no peito. Não era o peso de telas inacabadas ou pincéis abandonados, mas o fardo de uma arte que já não carregava significado algum e a ausência de significado o incomoda. Ele olhou para suas mãos, outrora sujas de tinta e agora limpas como se nunca tivessem criado algo. A arte, pensou ele, tornara-se um espelho vazio, refletindo apenas o rosto exausto de quem a produz e a contempla.

Os museus tornaram-se vitrines de consumo metafísico. As obras eram cuidadosamente dispostas para agradar aos olhos fatigados dos turistas (que mal sabiam que algumas obras foram pintadas por elefantes) e para alimentar algoritmos que decidiam quais artistas mereciam quinze minutos de fama. Não havia mais espaço para o desconforto ou a provocação; tudo era suavizado até se tornar inofensivo. Nenhuma pintura sobreviveria nesse mundo. Pintar latas de sopa ou rostos icônicos; Pintar o silêncio entre as palavras e as sombras que dançavam nos cantos das salas vazias. Nada disso adiantava.

Os críticos, agora convertidos em curadores do efêmero, falam sobre profundidade com a mesma superficialidade com que descrevem a última tendência em roupas ou tecnologia. "A arte deve ser acessível", dizem eles, enquanto descartavam qualquer obra que exigisse mais do que uma olhada rápida. Pergunto-me se eles sequer lembram do tempo em que a arte era um grito contra o conformismo, um chamado à consciência crítica, e toda sua manifestação contribuição na formação de pessoal que alteraram consideravelmente o modus operandi da nossa espécia.

O Declínio da Arte como Ferramenta de Consciência Crítica

Mas o verdadeiro horror residia nos próprios artistas. Muitos haviam adoecido, física e mentalmente, tentando se adaptar a esse novo paradigma. O mercado (ou seja, nós) exige produtividade incessante: séries intermináveis de obras replicadas como mercadorias em uma linha de montagem. A criatividade fora substituída pela repetição mecânica; a inspiração, por prazos apertados e contratos sufocantes. Vi vários colegas sucumbirem ao esgotamento e à depressão, enquanto tentavam equilibrar a necessidade de sobreviver com o desejo de criar algo significativo.

Os murais revolucionários de Diego Rivera, que outrora gritavam contra a exploração dos trabalhadores e celebravam a força coletiva do povo, hoje são lembrados apenas como relíquias históricas. E os artistas contemporâneos? Eles pintam paredes para marcas multinacionais, transformando sua criatividade em propaganda disfarçada. O grafiteiro que antes desafiava o sistema com mensagens subversivas agora é contratado para decorar escritórios de startups.

A cidade ao redor pulsa com uma energia incompreensível, hiper estimulante. As galerias estavam cheias de visitantes apressados que passavam pelas obras como quem percorre prateleiras de um mercado. As cores eram vibrantes, as formas agradáveis, mas tudo parecia vazio. As pessoas não olhavam para as pinturas; olhavam para si mesmas refletidas nelas. A arte havia se tornado um espelho polido demais, incapaz de revelar qualquer coisa além da superfície.

Lá fora, externo ao meu corpo, o mundo segue seu curso miserável. As galerias eram vitrines de vaidades, os museus haviam se transformado em parques temáticos para turistas apáticos, e as redes sociais eram os novos altares onde se sacrificava a autenticidade em troca de likes e seguidores. A arte não é mais um grito ou uma denúncia ou semente; é um produto. Algo embalado, etiquetado e vendido como qualquer outra mercadoria descartável.

Lembro-me de reuniões com profissionais que facilmente se encaixam no conceito de curador. Homens e mulheres de rostos lisos e vozes suaves que falam sobre tendências e mercados como se fossem sacerdotes de uma religião incompreensível. "Sua obra precisa ser mais acessível", ouvi certa vez. "Algo que capture o olhar imediatamente."

No fim, cedemos ao que o mercado (nós) quer. Cada projeto, obra, expressão, tornou-se um pulsar insignificante e alguém que busca se expressar através da experiência pessoal refinada no ofício de cada um.

Prostituimo-nos. E como poderia ser diferente? É exatamente o que o sistema quer que pensamos.

O Artista Como Engrenagem: A Máquina da Alienação

Há uma ironia cruel no fato de que vivemos na era da comunicação global e, ainda assim, a arte perdeu sua voz. Ela deveria ser o grito que rompe o silêncio opressor; deveria ser a faísca que acende revoluções.

Mas agora ela é apenas mais um ruído no fundo da cacofonia digital."Guernica", de Picasso, foi um grito contra a brutalidade da guerra — um grito tão poderoso que ecoou pelo mundo inteiro.

Mas onde está o "Guernica" do nosso tempo? Onde está a obra capaz de capturar o horror das crises humanitárias modernas ou a devastação ambiental?

Em vez disso, temos instalações vazias e performances sem alma, criadas não para confrontar o público, mas para entretê-lo.A arte contemporânea tornou-se cúmplice do sistema que deveria desafiar. Ela se esconde atrás de conceitos obscuros e discursos pretensiosos para evitar qualquer confronto real com as questões urgentes do nosso tempo.

Enquanto isso, os verdadeiros gritos — aqueles vindos das periferias do mundo — são silenciados ou ignorados.E assim seguimos adiante: consumindo arte como consumimos fast food — rapidamente, sem pensar, sem sentir. Os museus tornaram-se templos da superficialidade; as galerias são vitrines para especuladores financeiros; e os artistas são reduzidos a fornecedores de conteúdo.

O Vazio Que Resta

O estado atual da arte é um reflexo fiel do estado atual do mundo: fragmentado, alienado e vazio. Mas talvez haja esperança nesse vazio — porque onde há vazio, há espaço para algo novo surgir.Talvez seja hora de destruir tudo e começar novamente. De abandonar as galerias e os museus e levar a arte de volta às ruas; de rejeitar as métricas digitais e buscar conexões humanas reais; de parar de criar para agradar e começar a criar para confrontar.Porque se a arte perdeu seu propósito transformador, então cabe a nós devolvê-lo a ela.

E se isso significa errar no processo

— se significa falhar repetidamente enquanto tentamos encontrar algo verdadeiro —

então que assim seja.

Porque pior do que falhar é aceitar este estado mórbido como inevitável. Pior do que errar é permanecer calado enquanto tudo desmorona ao nosso redor.E talvez seja exatamente isso que a arte precisa agora: menos perfeição e mais caos; menos conformidade e mais coragem; menos silêncio e mais gritos — mesmo que ninguém esteja ouvindo.

A Arte Como Reflexo de um Mundo em Ruínas